Desde pequeno, eu sabia que um dia moraria fora do Brasil. Sempre senti que essa paixão por viajar e o desejo de morar no exterior era algo de outra vida, inexplicável, e que eu faria um dia.
Após algumas milhas viajadas e vários carimbos no passaporte, estou morando há dois anos na Irlanda. Confesso que o país não me cativou no início e fui bastante crítico a ele.
Minhas críticas ainda persistem, mas minha qualidade de vida está tomando outra forma e o prazer que sinto em estar aqui é muito maior do que outrora.
Mais do que na Irlanda, amo morar na Europa e me sentir um pouco parte disso tudo. Quando estive aqui pela primeira vez, em 2011, sabia que o retorno era certo, só não previa que seria tão rápido.
Pensando nessa paixão incondicional pelo continente, elegi o que mais me faz feliz por morar aqui. Confiram!
1 - As companhias aéreas low cost são realmente de baixo custo.
Para quem está acostumado com TAM, GOL, Azul e outras empresas brasileiras que se dizem de baixo custo, não tem noção do que é uma empresa realmente low cost.
No Brasil, não conheço nem cinco opções de empresas desse tipo para voar pelo país inteiro, quanto mais para o exterior. Mal mal, a GOL ainda faz alguns voos mais em conta para a Bolívia e Paraguai.
Dificilmente, você achará uma barganha por menos de R$20,00, e quando encontrar algo do tipo, a passagem estará vinculada a uma de retorno com tarifa cheia ou ainda às taxas aeroportuárias, que farão seu preço final beirar os três dígitos.
Em geral, pontes aéreas comerciais, tipo Rio-São Paulo (que duram 44 minutos de voo) ou Belo Horizonte-São Paulo (56 minutos de voo) custam em torno de "módicos" R$100,00 a R$130,00, que para a realidade da maior parte dos brasileiros é caro.
Na Europa, um voo internacional com duração similar, tipo Dublin-Londres, custa na maior parte do ano ¢9,99, o preço de duas pints (tulipas) de cerveja.
Um voo de Belo Horizonte a Salvador, que leva em torno de 1h40, custa pelo menos R$200,00. Já um de Dublin a Oslo, que dura em média 2h10, custa ¢20,00.
Esses são poucos exemplos para mostrar que as empresas aqui fazem jus ao título de low cost a elas dadas.
Na Europa, conheço pelo menos 20 opções diferentes de companhias de baixo custo, fora as opções de empresas convencionais, que também operam voos com passagens bastante acessíveis. E o mais legal, todas elas o levam para diveras partes do mundo!
O que dizer do plano da Ryanair de oferecer viagens para os Estados Unidos por ¢10,00? O que dizer de um voo que fiz de Dublin a Budapeste por ¢0,01? Surreal, no mínimo!
2 - Viajar para o exterior é como ir de um cidade a outra em uma metrópole brasileira.
O tempo gasto e a distância percorrida para se viajar dentro do Brasil seriam suficientes para rodar a Europa inteira, com seus 58 países, principados e ilhas.
Para a maioria dos mortais brasileiros, fazer uma viagem de uma cidade a outra, significa esperar pelos seus 30 dias de férias, que acontecem uma vez ao ano, a não ser que estejamos falando de ir de um centro metropolitano a uma cidade satélite, tipo Belo Horizonte e Betim. Ainda assim, não é uma rota feita diariamente pela maioria de nós.
Se queremos ir a uma praia, vamos ao Espírito Santo, Rio de Janeiro ou Porto Seguro. Mais do que isso já começa a ficar mais caro e menos acessível para a grande maioria da população.
No entanto, na Europa, qualquer ¢10,00 o permitirá fazer uma viagem internacional, como de Portugal à Hungria ou da Inglaterra à Turquia. O tempo que você gastaria em um voo do sul ao norte do Brasil, muito provavelmente você atravessaria o continente Europeu inteiro.
Então, nas suas férias aqui que podem ser tiradas quando você quiser (no meu emprego é assim), o que você faz? Certamente, vai tomar um sol nas paradisíacas praias gregas, esquiar nos alpes suíços ou mesmo comer uma boa pasta italiana, na Itália.
3 - Falar dois ou três idiomas aqui é normal. O diferente é falar 5 ou mais.
Eu sempre amei idiomas e essa coisa de poder falar vários deles. Hoje, me comunico razoavelmente bem em espanhol, inglês e francês. Tenho uma boa noção de alemão, comecei a estudar croata e agora estou estudando italiano. Bom, parece algo de outro mundo, não é? acreditem, não é não.
O brasileiro (in) felizmente não tem essa cultura do idioma incutida nas suas raizes. Primeiro por que nosso país é gigante e não temos tanta ligação com nossos vizinhos como na Europa, a não ser nas regiões de fronteira. Segundo, por que mal mal falamos português, quem dirá outro idioma. E, terceiro, por que o inglês e espanhol ensinado nas escolas do Brasil jamais darão fluência a um estudante.
Por aqui, pessoas que tem o inglês como primeira língua não se esforçam muito para aprender outros idiomas, por que afinal, o inglês é falado em qualquer lugar do mundo. Por outro lado, nas minhas andanças por aí, percebi que pessoas cuja língua mãe não é o inglês, acabam se esforçando para aprender mais e acabam se tornando exímios poliglotas.
Por uma questão geográfica, suiços crescem estudando alemão, italiano, francês e franco-suiço, além do inglês. Tchecos, poloneses, eslovacos, eslovenos e outros países de língua eslava acabam sendo obrigados a aprenderem outros idiomas, em função da necessidade de comunicar e ser muito mais difícil para outras pessoas aprenderem suas línguas.
No meu ciclo de amigos, uma jovem francesa de 25 anos fala inglês, russo e espanhol. Meu novo colega de quarto, de Bangladesh, fala sete idiomas. Uma romena que conheci na Noruega falava oito idiomas. E por aí vai... Não raro conheço pessoas que com esse perfil aqui e isso me deixa alucinado para aprender mais e mais.
Hoje em dia, quem fala três ou quatro idiomas para mim é um ser normal. Por que esse é o padrão que tenho visto no Velho Mundo. Mais do que isso já é um diferencial.
4 - Criminalidade aqui é roubo de bicicleta.
Certamente, na Europa há crimes graves, como assassinato, roubo à mão armada ou arrombamento de carros. No entanto, isso é muito mais raro do que se pensa na maioria dos países do continente. Historicamente, os amigos do leste europeu tem uma fama menos privilegiada. Porém, o oeste já é mais famoso por sua integridade e tranquilidade neste quesito.
Por aqui, se bobear, a taxa de suicídio é muito maior do que a de homicídios em vários países, principalmente nos nórdicos.
Em países como Holanda e Irlanda, onde a bicicleta é um dos principais meios de transporte, o furto das magrelas é um dos crimes que mais vejo.
Aqui na Irlanda, você pode ter um super carro e deixar no meio da rua 24 horas por dia que nada acontecerá, mas não deixe uma bicicleta com amortecedores, freio à disco e peças Shimano em qualquer lugar. Não arrisque passear com sua mountain bike e trancá-la no poste enquanto vai para a aula, por que quando voltar é possível que só encontre o cadeado.
Isto à parte, você pode sair nas ruas com sua corrente de ouro, sua mochila nas costas, ouvindo o mp3, voltar da balada às quatro horas da manhã à pé... e a chance de algo acontecer a você é quase nula. Mas fica a dica, não vacile por aí só por que você está na Europa.
5 - Ter gringos no seu ciclo de amigos faz parte da sua rotina.
É perfeitamente possível viver no exterior e não ter gringos no seu ciclo de amizades. Basta viver nas comunidades brasileiras espalhadas mundo afora. E, incrivelmente, muita gente faz isso. Do mesmo jeito que asiáticos, indianos, poloneses, e outros mais se juntam d parmenecem conectados aos seus compatriotas.
No entanto, é praticamente impossível não ter um amigo gringo no seu dia a dia. Seja ele seu empregador, colega de trabalho, namorda (o), vizinho ou mesmo uma amigo de balada.
Isso nos enriquece demais enquanto seres humanos. Temos a oportunidde de aprender muito sobre a cultura dos outros e evoluirmos um pouco mais a nossa própria.
Acho fantástico quando estou com alguns amigos e paro para pensar que sou o único brasileiro da roda. Hoje em dia, tenho amigos italianos, filipinos, nigerianos, congoleses, franceses, espanhois, americanos, canadenses, gente do Malaui, Modávia, Bangladesh e muitos outros lugares que não faço idéia de onde ficam no mapa.
A diversidade cultural é tão grande que você percebe que aquele mundinho que você viva antes era completamente desinteressante e que esse universo novo tem muito mais oferecer e o enriquecer.
6 - O transporte público aqui é exemplar.
Dublin não tem o melhor transporte público da Europa. O daqui é pobre por sinal se comparadao a outros.
Só há duas linhas de metrô de superfície, não há metrôs subterrâneos, os ônibus são de dois andares (como os da Inglaterra) e com wi-fi gratuito. O website da empresa tem até quadro de horários em tempo real com os horários que os veículos irão passar nos pontos. Com isso, você consegue se programar e sair de casa de forma a não esperar horas a fio um ônibus no ponto.
Os trens não são de alta velocidade, mas são até bons e também possuem wi-fi gratuito dentro. Certamente, dão de mil no sistema de transporte de qualquer lugar do Brasil.
Agora se você for para a vizinha Inglaterra...Meu Deus! É simplesmente sensacional. O sistema metroviário mais antigo do mundo é também um dos melhores, se não o melhor. Coloca o da Irlanda no chinelo. Você consegue chegar literalmente em qualquer lugar da cidade sem precisar de um carro.
E o metrô de Copenhague que nem condutor tem. Ele é todo automatizado e ainda possui portas nas plataformas que só se abrem quando a porta do metrô abrir, impedindo então que passageiros tenham acesso aos trilhos.
E o que falar dos charmosos bondinhos de Lisboa e de Istambul? Exemplos não faltam. Até o sistema de bicicletas públicas é fabuloso, conectando vários pontos das cidades por preços como ¢10,00 a ¢20,00 por ano para uso ilimitado das magrelas.
Na Europa, ter carro é um luxo para garantir um conforto ou praticidade, mas é dispensável na maior parte das vezes dada a eficiência do transporte público.
Horas de congestionamento e atrasos para chegar ao serviço já não fazem parte do meu dia a dia mais.
7 - Aqui também tem muito verde.
O Velho Mundo soube preservar sua natureza. É muito comum se encontrar parques espalhados pelas cidades. Grandes, médios ou pequenos, eles acabam sendo refúgio de locais e turistas nos piqueniques de fim de samana, no descanso do fim de tarde ou no dia ensolarado do verão.
Eles são locais extremamente seguros, vigiados por "rangers", que são tipo uma polícia florestal. São limpos, podem possuir lagos, animais, esculturas, e são um verdadeiro centro cultural ao ar livre.
Nem só de arquitetura antiga vive um amante da Europa. Aqui em Dublin, não raro frequento o Phoenix Park, um dos maiores parques europeus, local onde faço uma corrida de fim de semana, jogo bola com os amigos, mantenho a qualidade de vida que só lembro ter tido na infância, em Carajás.
Em geral, a maioria das cidades européias tem um grande jardim ou parque fabuloso. A citar, estão os de Luxemburgo, Versailles, Keukenhof, Viena e Queluz.
Então meu amigo, no seu dia de folga, eis aí uma dica de lazer. Piquenique no paque.
8 - A desigualdade social é muito menor.
Desigualdade existe em qualquer lugar do mundo, afinal, ela é fruto do capitalismo selvagem em que vivemos. Mas algo que me surpreende muito na Europa é que o abismo entre ricos e pobres é muito menor do que em países sub-desenvolvidos. Ao menos aqui na Irlanda, salários exorbitantes são um privilégio de muito pouca gente. Na maioria dos casos, o sujeito que ocupa um cargo muito alto em uma empresa não possui um salário tão mais alto que aquele que trabalha numa posição dita menos favorecida.
Na Suécia, políticos não ganham salários e não possuem mordomias, como gabinetes, transporte oficial e auxílios financeiros.
Assista a este vídeo abaixo:
No fim das contas, você enquanto cidadão não se sente escravo de um sistema que favorece poucos, como no Brasil.
9 - O seu direito é sempre preservado
Ano passado, comprei uma passagem para Donetsk, na Ucrânia, e devido aos conflitos em Simferopol, a empresa aérea cancelou meu voo. Ainda sim, remarquei a passagem para Kiev na convicção de fazer a viagem. Mais tarde, os conflitos se agravaram e pedi o cancelamento da passagem por medo do que estaria por vir. Com menos de uma semana, meu investimento foi estornado sem quaisquer transtornos.
Em outra viagem, da Alemanha para a Irlanda, tive pela primeira vez um voo atrasado em Frankfurt. O atraso foi de cerca de seis horas.
Na maior inocência, esperei o avião chegar e segui rumo de volta para casa. Voltei ao trabalho no dia seguinte e nunca mais lembrei desse voo, até que nesta semana, a empresa Flight Right me mandou um e-mail afirmando que eu tinha direito a um ressarcimento financeiro em função do atraso daquele voo, que acontecera há exato um ano.
Sem menos esperar, tenho alguém lutando pelos meus direitos por mim. O legal é que com 98% de certeza (taxa de sucesso da empresa) vou reaver algo em torno de R$1200,00.
Não menos importante, fiz uma compra online no Groupon, de uma balança digital, que custou em torno de ¢10,00 e que nunca me foi entregue. Após solicitar o ressarcimento do investimento, lá estava na mnha conta, em menos de uma semana o pedido.
Indo mais além, dentre todos os países da Europa, somente Irlanda, Polônia malta não tem o aborto legalizado. Nos demais, o direito da mulher decidir por interromper ou não uma gravidez é assegurado e regulamentado. Ainda, a Irlanda foi o primeiro país do mundo a aceitar o casamento de pessoas do mesmo sexo através de voto popular.
Exemplos não faltam para mostrar o quão importante o cidadão é para os países aqui. É o Velho Mundo dando aula ao dito Novo Mundo.
Agora me diga, tem como não amar um lugar desses?